quarta-feira, 27 de julho de 2011

Pré-requisitos

Ficar na moita, só e em silêncio faz abrir a mente e o coração, e escutar batida por batida, cada neurônio dizer o que realmente almeja. Eu quero ouvir umas boas músicas anos oitenta, quero olhar a lua, dia após dia, e acompanhar suas mudanças, nuances e a sua delicadeza. Eu quero que a minha bipolaridade se amenize, que os efeitos não sejam tão radicais, e cortantes. Eu quero casar de véu, grinalda e vestido branco, numa igreja pequenininha, mesmo que não agora. Quero uma massagem nos pés, e massager as mãos, costas e pescoço de alguém, só para emilinar de vez toda essa minha força e raiva, essa repressão sentimental que acometo comigo mesma, quero ver o mar e sentir a areia, deixar o sol penetrar na minha pele, e bronzear, quero a sincronicidade dos relacionamentos, umas pistas do destino e ver tudo às claras, tudo às boas. Eu quero me manter no papel de mulher independente, quero a cura da minha instabilidade emocional, e descer às vezes, quando necessário dessa minha montanha russa que intitulo, vida.
Eu quero ao meu lado as pessoas que exalem a exentricidade, gente louca, pessoal estranho que eu possa me aprofundar, crescer e rir numa boa. Quero agora, ou nunca mais. Now or never. Oito ou oitenta.
Eu quero demonstrar interesse sincero, quando possível e não desse meu jeito intenso e reacionário, quero tudo por completo; nada de restos, ou pedacinhos, migalhas. Eu quero a fé. Eu quero um pequeno apartamento, e viajar pelo mundo! Quero a sensibilidade dos corações partidos, e transpor tudo isso pro papel. Eu quero ohana, quero família, famiglia. Quero nunca mais abandonar, nem esquecer. Eu quero livros, seus sebos, mofos, traças e complexidades. Eu quero o charme, o encanto e a sedução; tudo isso é essencial. Quero declarações inesperadas, totalmente irrompidas de preceitos e vergonhas, na cara e na coragem. Eu quero observar, e não falar nada. Porque não é preciso. Quero a simplicidade (pra que muito?). Eu quero a auto-suficiência em amizades. Eu quero que as minhas atitudes independam da de qualquer pessoa, para que tudo que faça, sinta e veja sejam verdadeiramente eu. Eu quero que não te preocupes, porque embora o mundo esteja assim às avessas e sucumbido de modernidade, tudo ainda é natural. Como dizia Caio, se for pra gente se encontrar, a gente se encontra. Aqui ou na China.

Dilacera mas passa

Chorei. Assim como vinha deixando que o berreiro se fizesse vivo, dei início à sessão das lágrimas na lotação, ao olhar a chuva que caía na janela, e a tarde de sentimentos estranhos e intrínsecos. Bem verdade que vinha me emocionando com facilidade, e sem motivo aparente. Com reportagens banais, e músicas melancólicas. Nos livros que tenho lido, e no escuro, sozinha e imersa na minha tristeza que nem ao menos consigo compreender. Com soluços. Sem pausas. Extirpando toda essa dor que vem, e não passa, e quando vira felicidade, de tão aguda, se torna insuportável. Quase um sentimento hemofílico, que não estabiliza nunca: quando começa a cicatrizar, não processa bem; é ferida aberta, cutucada. Mais uma vez, solitária no mundo, sentada sem vista pra rua, com essa incompreensão no peito e uma angústia que não desgruda de vez. Enquanto todos me dizem que preciso ser forte, que o silêncio é arma, a indiferença é o que mata, e viver é preciso, meu único pensamento é em comprar passagens aéreas e sumir pelo mundo. Deliberar sem mais recados, fugir de toda essa loucura que acomete as pessoas, o medo nojento que os outros têm de dar amor, e receber também em troca. O amor é essa ciranda onde todos rodeiam, e cantam, exibem sorrisos e feições de satisfação, em que eu me encontro excluída, sentada num canto, de braços cruzados e cara amarrada. Ninguém me convida, e fico apenas atenta, observando os casais que se completam, a vida que se move, e os beijos que não dou, as juras eternas que não escuto. Fujo algumas vezes, tapo os olhos em outras, mas a roda incessante e desgovernada apenas brinca de bobinho comigo e minha esperança em ser chamada; garotinha tola que quer se divertir um pouco, e não sabe entrar - apenas pedir, pedir e pedir, nunca penetrando de vez. Se deixando iludir por cartas, e signos, mensagens inoportunas, sinais divinos, que na verdade dizem nada e fantasiam qualquer dúvida posta em questão.Fica difícil assim me focar em mim de imediato, em tudo que sinto, em curar a cada dia toda essa peste que me tomou o alma, e embeveceu a vivacidade que eu carreguei, até aqui: só se vê os defeitos, aquilo que precisa ser melhorado, e expectativas tão longínquas, que não satisfazem, e sim, enlouquecem. Só quando sozinha é que me deixo ficar meio down, e coloco o dedo na ferida. Escuto músicas sofríveis, e leio melancolias. Dói, mas passa. E esse desespero de me verem assim na fossa, mal à beça? Calma, que preciso escancarar essa dor até o final, que ela é só minha, e libertar o peito, a alma, o cuore. Tirar talvez um ódio de onde não consigo, e de quem não tenho, mesmo que passageiro, para que eu sobreponha no local onde ainda há quase tudo o que sinto, e que precisa ser esvaziado, pouco a pouco. Sair desse poço, largar de vez o osso, desses restos que não alimentam, e sim, atrofiam o que de belo existia, e se queria profundamente. Porque logo chega setembro, e toda uma primavera virá, até que se torne verão novamente. Terá passado tanto tempo, que as respostas chegarão sem medo e nem culpa, e voltarei a ser inteira como fui até certo tempo. Sem voltas comemoradas, e inexplicáveis. Sem apagar do caderno, mas riscar por cima o nome; ter astúcia suficiente de virar mais essa página pesarosa Sem mais chances, que depois da segunda, a terceira não tem argumentos para vingar. É topando em pedras, que vislumbramos com mais atenção as flores que nascem, as gotas de orvalho da grama, a raiz de tudo. Desde os sentimentos mais profundos, profanos, ao mundo.